Ted Chiang é um dos meus autores favoritos de ficção científica porque cada história nasce de uma profunda curiosidade que ele possui sobre o assunto. Ele que escreveu o conto que baseou o filme A Chegada que já mostra um tema recorrente encontrado neste livro de contos: a precognição como profecia autorealizada. E o que acho que é o tema central do que li de Ted Chiang, principalmente nessa coletânea: a aceitação.
Quais as implicações da viagem no tempo se fosse impossível mudar a linha temporal? Conforme uma inteligência artificial se assemelha da inteligência humana, ela não teria que ser criada como uma criança humana?
Sempre tenho dificuldade de resenhar livros de contos, porque afinal não estou falando de uma história, mas de diversas narrativas e sempre fico em dúvida sobre o quanto devo me aprofundar em cada uma. Mas algo que sempre tento me perguntar é: que temas todos esses contos tem em comum.
Vamos conversar sobre cada um deles.
The Merchant and the Alchemist’s Gate
Talvez o meu conto favorito da coletânea, que já tinha ouvido em forma de podcast anos atrás. Mistura fábulas ao estilo das Mil e Uma Maravilhas Arábicas com ficção científica e viagem no tempo. Um comerciante encontra um mercador que possui um portal para vinte anos no futuro, e as implicações não pensadas da viagem no tempo. E se você ver que esta vivo em vinte anos, poderia se achar imortal e lutar em batalhas sem se preocupar. Mas quem sabe, quem busca esse tipo de garantia não se encontraria no futuro em primeiro lugar.
E temos casos curiosos, como um homem que vai ao futuro e rouba dele velho, perde tudo, passa a vida pra repagar ele mesmo. Além de paradoxos temporais e me lembrou as tragédias gregas, como Édipo Rei, em que tentar mudar o destino é justamente o que o realiza.
Exhalation
Um sci fi sobre um robô que abre o próprio cérebro tentando entender o seu funcionamento, com ares meio steam punk, da consciência funcionando através de filamentos de ouro mantidos suspensos no ar. Com seus cérebros ficando mais lentos, é contemplado com a ideia que a perda de pressão de seu universo vai levar inevitavelmente a uma espécie de demência. Lembrou a perda inevitável de energia do nosso próprio universo, assim como o roubo de energia de outro universo de Os Próprios Deuses, de Asimov.
What’s Expected of Us
Um conto aparentemente simples, que Ted Chiang leva a implicações curiosas. Trata de um “pdictor”, um aparelho semelhante a um controle de garagem cuja luz pisca um segundo antes de você apertar. Ou seja, algo bobo assim acaba com a ideia de livre arbítrio e traz de novo a ideia de inevitabilidade; e como a mente lida com a inevitabilidade. Depois de algumas semanas obcecadas com o brinquedo, se torna uma praga cognitiva, um pensamento que mata o pensador. Semelhante ao Lovecraft, algo que você escuta ou vê que te deixa louco.
The Lifecycle of Software Objects
O conto mais longo do livro, que por sinal eu já li anos atrás em formato de novela, sobre digiens, inteligências artificiais que são criadas para ser uma espécie de pets, mas que se desenvolvem ao longo de décadas com seus donos.. Deixo o link na descrição do vídeo para não me repetir. Um tema que ele menciona é como uma consciência análoga à humana leva tempo para se formar. E talvez requira de uma atenção de pessoas, treinadores mais do que programadores.
Dacey’s Patent Automatic Nanny
Conto de tom vitoriano positivista sobre um cientista obcecado em criar uma babá-robô para os filhos, sem nem passar pela cabeça ele mesmo cuidar da criança. Inversão da ideia do conto anterior anterior: como seria uma mente humana cuidada por uma máquina?
The Truth of fact, The Truth of Feeling
Conto sobre o impacto intelectual de Life logs, gravação da vida inteira. Como uma filha que consegue escrever apenas com o auxílio de software; lembrou o japonês, a diferença entre saber escrever os kanjis ou digitar e reconhecer na tela
E depois chega no REmem, software que mostra automaticamente a sua memória relacionada ou que você fala ou ouve; substituir a memória; lembra um google pessoal no qual você pode buscar a sua vida.
Enquanto isso, o conto pula para um missionário em uma vila africana para mostrar na nossa mente o impacto de uma tecnologia que já temos: a escrita. Belíssima explicação da escrita: “um homem pode contar uma história por sinais, e outro pode olhar os sinais e ouvir o que o primeiro home disse, e saber a história como se estivesse onde ela aconteceu”.
Nós não costumamos pensar na escrita como uma tecnologia, mas ela é. Assim que somos alfabetizados começamos a nos tornar ciborgues.
The Great Silence
Conto bem simples sobre o paradoxo de fermi, e… papagaios conscientes? Confesse que esse eu não entendi muito bem
Omphalos
Conto interessante como seria a nossa sociedade se houvesse confirmação científica de que o mundo foi criado há 10 mil anos por deus, múmias de homens primordiais sem umbigo, etc. Ideia curiosa de que se Deus criou o mundo, pode ter feito criaturas com a memória de um passado que não existiu.
Anxiety is the Dizziness of Freedom
Sobre os prism, aparelho que cria uma realidade paralela na qual você pode conversar com texto ou vídeo com você mesmo. Você pode ver como a sua vida teria sido, ao ativar o prisma, uma única molécula afetada vai mudando o mundo exponencialmente e em um mês o clima do planeta é diferente. Teoria do caos, o bater das asas de uma borboleta na China afeta o clima em Nova York
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