HQ mostra a Segunda Guerra a partir das memórias de um veterano, trocando ação e batalhas pela observação minuciosa do cotidiano e do passado
A Guerra de Alan é o resultado do encontro e da amizade entre o quadrinista francês Emmanuel Guibert e Alan Ingram Cope, um norte-americano veterano da Segunda Guerra que permaneceu na Europa após o conflito e se aposentou em uma ilha no norte da França. Cope, um homem sensÃvel e com interesse em pessoas, música, poesia e literatura, tinha grande memória para os detalhes, o que dá muita riqueza ao seu relato.
Porque essa não é mais uma história da Segunda Guerra, mas sim do conflito segundo a trajetória pessoal de Cope. A HQ tem ausência quase completa de batalhas ou as atrocidades que costumam pontuar relatos do perÃodo. O próprio Cope só atirou uma vez em combate – com a metralhadora de seu blindado – e mesmo assim mal enxergou para onde mirava, quanto mais se acertou algum alemão. É possÃvel visualizar através das páginas Cope sentado narrando por horas suas histórias, daquelas de veteranos, tÃpicas para entediar netinhos, mas com um charme especial para quem se adequar à sua toada.
Cope é de fato um observador minucioso, lembrando detalhes de sua vida e uma série de historietas. Como quando ainda em treinamento foi com outros soldados comprar uma bisteca com outros soldados por meio dólar de um lenhador, seu primeiro encontro quase-sexual com uma adolescente cigana na França, uma alucinação durante uma patrulha noturna. Mas mais do que tudo, Cope se mostra um amante de pessoas, repetidamente tenta contato por carta com conhecidos após a guerra e dá grande importância com o destino das que cruzam seu caminho.
Guibert teve a sensibilidade de manter a perspectiva dentro do que Cope contava, mantendo até erros óbvios que ele confundiu em seu relato. Mas não se trata de como a guerra foi um dia, mas como ela se tornou para Cope em suas memórias. O estilo da arte acompanha o ar de lembrança dos relatos. Desenhos deixados pela metade, como que perdidos na névoa da memória, ou com traços incertos de aquarela em momentos marcantes.
Depois de ler A Guerra de Alan fiquei com a sensação de não ter lido uma HQ, mas ouvido um relato oral com as imagens sendo construÃdas pelo quadrinista. Uma obra sensÃvel e de grande valor para os interessados em história oral.
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