Jiro Taniguchi é um artista conhecido por seus mangás com personagens que andam sem rumo pelas ruas, sem horário para voltar, podendo passar uma tarde sentado em um parque olhando o vento balançar as folhas ou saboreando uma refeição sozinhos. São obras sobre a introspecção, observação apaixonada, sobre curtir a solidão sem ser solitário. Pode-se dizer que é uma versão japonesa contemporânea da figura do “flaneur” de Baudelaire.
Já existem duas resenhas de livros de Taniguchi no canal, O Homem Que Passeia e Gourmet (Kodoku no Gourmet), esse último um de meus livros favoritos de todos os tempos. Guardiões do Louvre traz um personagem semelhante, um alter ego do próprio autor, que em uma passagem por Paris fica doente e com delírios febris. Mesmo assim, ele não perde a oportunidade de visitar o Louvre, mas seu estado febril faz com que viva uma viagem em que realidade, sonho e memória se confundem, conforme ele explora tanto as obras como a extensa história do museu francês acompanhado de entidades, os tais guardiões.
A narrativa passa por diversos episódios marcantes do Louvre, como transferência ao mesmo tempo cuidadosa e desesperada do acervo do museu durante a Segunda Guerra Mundial para que as obras não caíssem nas mãos do exército alemão, ou um passeio pela obra de Van Gogh. O desenho não só homenageia algumas das maiores obras de arte da humanidade como traz uma arte sublime também. Os desenhos de mangá realista de Taniguchi no pico de sua forma artística ganha vida com belíssimas pinturas em aquarelas. O tamanho maior das páginas, de cerca de 32cm por 24cm, também permite apreciar os detalhes de cada quadro.
Eu senti um tom diferente entre O Homem que Passeia e Gourmet e Guardiões do Louvre. Os primeiros foram escritos nos anos 1990, com protagonistas mais centrados no trabalho e no dia de hoje. Já Guardiões do Louvre tem um tom de um homem revivendo o seu passado, rememorando a história da arte e do ofício de desenho ao qual dedicou toda a sua vida, além da memória da noiva falecida, doente e isolado em um país estrangeiro. Os primeiros livros são sobre a importância de viver intensamente o hoje, já Guardiões tem um tom de despedida, com um protagonista que sofreu perdas, em um último olhar para as memórias e os fantasmas do passado. Publicada originalmente em 2014, Guardiões do Louvre seria realmente uma das obras de despedida de Taniguchi, que faleceu em 2017.
Deixe um comentário