Obra curta mistura o sobrenatural com todas as lembranças da humanidade e excelentes cervejas
Em um futuro nĂŁo muito distante, praticamente toda a humanidade foi aniquilada por um vĂrus mortal. Sim, de novo. Mas Bar None consegue trazer algumas coisas novas a este clichĂȘ pĂłs-apocalĂptico.
A histĂłria gira em torno de cinco sobreviventes que se alojaram em uma mansĂŁo abandonada que pertencia a um arquiteto de certo renome na beira de uma cidade britĂąnica. O motivo para a escolha da morada Ă© simples: o local possuĂa uma vasta despensa com vinhos, cerveja e comida. Eles passam os seis meses apĂłs o fim do mundo se ocupando de uma horta que nĂŁo estĂĄ dando muito certo e tomando cerveja todas as noites, rememorando um mundo do qual apenas restos sobreviveram.
A chegada de um motoqueiro, primeira vivâalma que encontram em meio ano, muda todas as perspectivas. Primeiro pela clara natureza sobrenatural do visitante, que apĂłs a cervejada de praxe consegue falar sozinho com todos e com todos ao mesmo tempo. Ele avisa que as coisas estĂŁo para âmudarâ e que os sobreviventes precisaram viajar ao sul rumo ao Bar None, o Ășltimo bar da Terra. E em pouco eles partem em uma jornada rumo ao boteco lendĂĄrio atravessando os vestĂgios da civilização humana. Levando diversas garrafas de vinho, Ă© claro.
Os personagens sĂŁo bem construĂdos, mostrando traços de suas vidas passadas a cada momento. O narrador, ĂĄvido amante do suco de cevada, faz diversas reminiscĂȘncias de sua vida baseado nas diferentes marcas de cerveja que aprecia. Assim, quando toma um gole de London Pride se lembra quando provou da marca junto da esposa Ashley em uma passeata contra a guerra do Iraque, ou um gole de Double Drop traz de volta o dia que foram a um pub famosinho do interior e decidiram ter filhos. As cervejas sĂŁo praticamente um personagem Ă parte, como podemos ver no breve trecho traduzido abaixo:
Theakstonâs Old Peculier, profunda e escura e pesada, uma cerveja de churrasco com um toque achocolatado e um sabor final marcante, semelhante ao vinho, uma cerveja complexa, rica e poderosa como a pele de Ashley, os nuances da sua respiração, a gota de suor em sua nuca quando fazĂamos amor. Theakstonâs Old Peculier, a garrafa marrom ainda molhada e fria mesmo depois de estarmos sentados por mais de uma hora no jardim do Paul, observando-o virar a carne enquanto ouvĂamos Ă fita demo da sua banda e Ashley ao meu lado, tomando sua prĂłpria bebida e me tornando o centro do universo sem sequer olhar para mim.
O autor Tim Lebbon, conhecido conhecido por novelizaçÔes da sĂ©rie Alien, cria muito bem uma atmosfera de embriaguez perpĂ©tua, ligada Ă nostalgia de um mundo que nĂŁo mais existe. Ă um livro sobre lembranças, quase como se ao final de tudo restasse apenas uma mesa de bar com pessoas rememorando as vidas de toda a humanidade. O grupo encontra respostas, nĂŁo muitas, durante sua jornada ao Bar None e diversos percalços se apresentam ao perceberem que eles nĂŁo sĂŁo os Ășltimos sobreviventes assim como a exata natureza do cataclisma que limpou o planeta dos seres humanos.
Bar None Ă© um daqueles casos que atĂ© quem nĂŁo tem preferĂȘncia por ficção sobrenatural pode curtir, uma vez que a ĂȘnfase estĂĄ nos personagens e lembranças. Diria que Ă© um livro pĂłs-apocalĂptico para quem gosta de encher a cara.
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